20 de janeiro de 2019

Literatura oriental contemporânea: uma introdução

Olá.
Sim, estive meio sumido.
Não somente pelas festas de fim de ano, mas por estar desenvolvendo textos como esse, e lendo como se não houvesse amanhã.
O assunto é bem extenso, profundo e complexo.
Em meu outro blog, foquei em explicar partes da cultura asiática em diversas reviews antes de falar sobre a obra que iria abordar. Acho necessário ter esse conhecimento antes de falar sobre certas obras para podermos apreciar de forma mais clara e completa tais obras.
Antes de começar a apresentar um monte de reviews de coisas relativamente exóticas e pouco conhecidas pelo público brasileiro, achei de bom grado dar um panorama sobre a literatura asiática.

Quando releio os posts, há muita informação interessante neles, porém… ainda é complicado.
A literatura oriental tem uma gama enorme de informações e uma história e tradição ainda maior. Abordar aqui e ali sobre mangás, light novels, webcomics, literatura marginal e obras clássicas, deixa tudo com um ar meio vago.
Pior ainda quando incluo algumas explicações sobre a cultura local, seja japonesa, coreana ou chinesa. Pois quando se fala Ásia, eu penso nesses países. Óbvio, Rússia está ali. Assim como a Índia e todos os outros.
Mas convenhamos, quando se fala asiático, o que vem à cabeça de todo mundo é isso:

Admita

Pois é. Tenho sangue japa na mistura caótica que sou, conheço bem as piadas e afins.
Mas a realidade é que o mundo se torna mais asiático a cada momento, e não estou falando dos milhões de bebês chineses que nasceram enquanto você lia essa frase...
Muitos países e companhias gostariam de impor as condições brutais de trabalho asiático no Ocidente. E a cultura asiática cresce em popularidade a cada dia. Mangás, animes, light novels, literatura… O Ocidente sempre observa o Oriente com um olhar curioso.
E muitas vezes se perguntando “puta merda cara, o que caralhos vocês estão fazendo aí?”

A literatura asiática se inicia na China, em torno de uns três mil anos atrás.
Mas vamos com calma. Sempre lembrando: don’t panic.
Ok. Existe uma enorme variedade na literatura asiática. Muito do que é lido, depende da cultura local. Assim, vamos falar das 3 maiores.

China

China:
a base de tudo, uma das culturas mais antigas do mundo. A literatura chinesa é um oceano. Temos textos de séculos, até de um milênio atras, atrás que ainda são relevantes, como A Arte da Guerra, I-ching, entre outros. Também temos coisas mais modernas, como as obras de Mao. A mitologia chinesa é uma coisa fora de série. Desde uma enorme fauna e flora mística, passando por mitos de criação e deuses estranho, grandes obras de ficção como O Romance dos Três Reinos, entre outras. Sem esquecer os imortais e seu sistema de cultivação, o qual vou dedicar outro post para explicar…

O ideológico chinês tem muitas peculiaridades. E não somente a enorme influência do período comunista e sua exaltação do povo chinês. Inicialmente, temos uma grande influência confuciana. Não vou me detalhar, mas resume-se em honra, caráter e castidade. Curioso como a China manteve esses ideais por muito tempo, enquanto que no Japão, a coisa ficou fora de controle…
Um ponto curioso é a cena contemporânea na literatura chinesa. Mesmo com três milênios, a produção cultural chinesa não atingiu o imaginário mundial. Sua cultura é muito intrincada e complexa, com diversas referências a lendas, monstros, deuses, artes marciais reais e lendárias, entre outras coisas que se espera que o leitor já conheça ou tenha uma noção básica. O que acaba fazendo com que não seja tão bem recebida mundialmente, já que são tantas referências que a compreensão se torna complicada. Raramente vemos manhua (mangás chineses) virando animes ou afins. Por outro lado, a cena de light novels chinesa é insana, com milhões de escritores jovens fazendo fama e fortuna (mesmo que local) e cultivando uma série de fãs ao redor do mundo.

E nesse ponto, ela é realmente insana, com dezenas de categorias, das mais variadas. Tenho certeza que você encontrará algo que te agrade nesse meio.
O curioso dessa cena é que muitos ideais tradicionais foram mantidos, enquanto que outros foram jogados pela janela. Ideais de vigor masculino, haréns, força acima de tudo e obsessão com dinheiro são temas bem comuns nessas histórias. Na visão de mundo chinesa atual, poucas coisas são realmente importantes: família, sucesso, fama e dinheiro. Devido a insanidade com que a cultura incentiva esses sonhos, ao mesmo tempo em que simplesmente não oferece meios para a maior parte de sua população os atingir, muitas de suas obra se baseiam em wish fulfilment. Esse termo descreve bem muito do que é produzido. O que significa? Basicamente projetar ideais e situações nos personagens e na história. Como bater em seu chefe, ou humilhá-lo. Estar cercado de várias mulheres lindas que não ligam que você transa com todas elas. Enfim... E não, isso não é tão machista como você pensa, afinal mulheres têm o mesmo tipo de novelas para elas, com haréns masculinos e tudo o mais…

Um ponto curioso são os nomes de autores bizarros, como Eu Como Tomates (I Eat Tomatoes) cujo nome é um jogo de palavras em chinês com base nos caracteres de seu nome, que traduzidos… bem, ficam ridículos. Principalmente por eles começarem a escrever na internet, o que convenhamos, não é um lugar conhecido por sua seriedade.
Ah, e não se esqueça das condições desumanas de trabalho, mão de obra barata e sucateada, poluição a níveis alarmantes, controle estatal massacrante e regulatório.
Se você imagina que não estamos próximos de um futuro cyberpunk, é porque não leu o suficiente a respeito da China.
Acha curioso como uma cultura extremamente massacrante e alienante criou uma cena literária para jovens e jovens adultos tão forte? Não. Não deveria…
Como dizem, quanto maior a repressão…
O que nos leva ao próximo tópico.

Japão 

Japão: ok. Todo mundo sabe. Mangás. Animes. Hentai. A cultura japonesa tomou o mundo. Raramente você encontra alguém que não tenha uma opinião sobre isso. Apesar da maioria ter uma visão extremamente deturpada do que ela é. Sim, mangás e animes como Cavaleiros do Zodíaco e Dragon Ball Z existem. E eles são bem especificamente para crianças. Inclusive, existe um gênero específico para isso, shonen. Basicamente para jovens. Por outro lado, temos obras de inacreditável beleza no mangá, como Nozoki Ana, sobre o qual já fiz uma review (e que irei postar aqui traduzida), assim como horror corporal em níveis perturbadores (como o também já feito sobre Uzumaki). Sim, o grosso é para adolescentes, mas as obras de cunho adulto são extremamente perturbadoras. Homunculus é uma dessas obras, mostrando o declínio da mente de uma pessoa que passou por experiências envolvendo trepanação…
E sim, está na lista a ser analisada.
O numero de gêneros literários dentro da cultura japonesa é extremamente massacrante.


O Japão também é conhecido por sua... insanidade.
Tudo parece ser elevado ao extremo. A cultura japonesa pode ser definida por... quero ser diferente/me destacar.
Temos homens vestidos com roupas femininas da época vitoriana, passando por mulheres que se bronzeiam obsessivamente para tentar parecer com negras, homens de barba e roupas de colegial liderando bandas de Death Cutie Metal (um salve para meu herói LadyBeard, o herói que o mundo merece, não o que ele precisa...) E isso sem falar nos shows de TV totalmente insanos.

Hail LadyBeard!!

O ponto crucial é que a cultura japonesa, é extremamente massacrante. Em certos aspectos, a considero pior do que a chinesa. Enquanto que na China, o sonho de se sobressair e virar um milionário é difícil, porém melhor do que na cultura japonesa, que empurra tudo e todos para um horror suburbano de classe média. É comum pais serem ausentes, assim como distantes. Eles passam mais de doze horas no trabalho, as crianças e adolescentes também são condicionadas a essa vida, com mais de doze horas em sala de aula, assim como a expectativa de que façam parte de grupos após as aulas, estendendo a jornada a níveis alarmantes.
A insanidade japonesa, em parte, é explicável. Com tanta tensão e ansiedade, as pessoas anseiam por duas coisas: se diferenciarem da massa, ou simplesmente afundar na apatia e rir.

Isso sem contar toda a insanidade em relação a sexo e afetividade, onde você pode fazer horrores no quarto, ler material pornô gráfico pesado no metrô em horário de pico, mas beijar sua namorada na boca no meio da rua é extremamente chocante.
E mesmo assim, a vida no colegial é sempre vista como o melhor período da vida das pessoas. Sim, é por isso que existe tanta mídia focada nesse período.
Mas não esqueçamos: o Japão é uma terra insana, e quando as coisas saem de controle, tomam outra proporção. Que é o que ocorre com escritores incríveis da literatura adulta japonesa. Escritores como Haruki Murakami, Osamu Dasai e Yukio Mishima elevaram a literatura japonesa a um patamar diferente de tudo já escrito antes. A sua linguagem massacrante, a angústia, a pressão social, tudo isso leva a uma relação de identificação universal. O que resultou em diversos Nobels, prêmios e certa reverência pela literatura japonesa como um todo.

E por fim, em relação as light novels, bem… eles tem uma produção e consumo tão insano como nos outros países. Porém, sempre achei que boa parte das novelas japonesas levam as coisas de forma mais… leves. Óbvio que uma ou outra é bem pesada, mas a maior parte da produção é bem leve em seus temas e com um foco enorme em jovens.
O Japão tem a necessidade de rir, de ter momentos de prazer, mesmo no meio do maior horror existente, sempre há humor. O que me agrada e desagrada ao mesmo tempo.


Coreia

Coreia: tenho pouco contato e conhecimento da cultura coreana, tendo apenas alguns pontos e vivências. Li alguns manhwa (versão coreana para mangá) os quais me surpreenderam por sua qualidade e imaginação. Mesmo histórias básicas conseguem ter um apelo diferenciado. Sem contar que violência é algo ainda mais comum do que nos outros. Curiosamente, o ideário confuciano foi meio que abandonado, com o grosso dos jovens coreanos sendo bem livres sexualmente.

A Coreia é outro lugar de horror social, porém, de todos eles, o considero mais aberto e flexível. Apesar de certas tradições serem seguidas, considero a Coreia como um dos países mais ocidentalizados do Oriente. O padrão, modo de vida, relacionamentos e afins são muito próximos do que vivemos no nosso dia a dia.

Porém, não me agrada o extremo xenofobismo. Raramente alguém que se casa com um não coreano é bem vindo de volta a casa dos pais. E se for com um japonês, esqueça, não tem mais família. Sim, conheci um casal assim em Toronto. Ambas as famílias cortaram relações com eles. Porém, era um dos melhores restaurantes japa/coreano daquela cidade. Tudo bem que asiáticos como um todo são xenófobos, preconceituosos e focados demais na própria cultura, mas coreanos em particular ainda mantém muito dessa forma de pensar. Ou ao menos em minha experiência pessoal.

Os aspectos culturais desses países obviamente causam grande impacto em sua literatura, os quais pretendo abordar mais especificamente quando for escrever sobre um deles. Afinal, isso é somente um panorama.
Já aproveito e informo que não irei falar de obras famosas, como O romance dos três reinos, Dragon Ball, One Piece e similares. Muito já foi escrito sobre elas.
Meu foco são em obras menores, algumas desconhecidas, algumas das quais até que são bem conhecidas em seus nichos.

Irei falar de light novels, mangás, obras de ficção, obras de não ficção e o que mais tiver.
De acordo com o tema da obra irei falar um pouco sobre as questões culturais específicas, como sexualidade no Japão e Coreia, mitologia chinesa, assim como peculiaridades dentro de peculiaridades que podem surgir, como os gu de Reverend Insanity.

Faz certo tempo que me interessei pelo tema, tendo lido diversas obras, portanto tenho muito o que escrever a respeito.
Tanto bem quanto mal.

Então se tem algum interesse nisso, prepare-se: tem um monte de reviews vindo pela frente.

See ya

21 de dezembro de 2018

O restaurante no fim do universo - Douglas Adams (O Guia do Mochileiro das Galáxias #2)


Olá! 
E mais uma vez voltamos ao universo de Douglas Adams!

O livro começa nos dando um panorama sobre o que aconteceu, de forma irônica. Em seguida, nós mostra a nave vogon perseguindo nossos heróis (usando o termo de forma bem generosa). Temos um vislumbre do possível responsável por tudo que aconteceu, o psicólogo Gag Halfrunt. Por que e outras perguntas são irrelevantes no momento. 

Arthur está em uma discussão com o processador de bebidas, tentando fazer um copo de chá. Em sua explicação do que é chá e como fazê-lo, ele acaba travando totalmente todos os circuitos da nave. Exatamente enquanto todos estão tentando fugir dos vogons. Os quais resolvem atacar. 

No meio disso, Zaphod resolve fazer uma sessão espírita e invoca o espírito de seu bisavô. Em uma discussão acalorada, Zaphod e seu bisavô discutem até Zaphod ter uma epifania e ser informado sobre qual sua missão. Descobrir quem é a pessoa que realmente detém poder no universo. Afinal, todos sabem que o cargo de presidente não tem nenhum poder, na verdade, apenas distrai as pessoas do poder real. O avô de Zaphod os ajuda, garantindo que ele pode se ferrar se precisar de ajuda novamente… 

Halfrunt se delicia com a notícia da morte da trupe. Afinal, se a resposta e a pergunta for de conhecimento universal, como diabos psicólogos irão fazer dinheiro? Enquanto isso, o grupo se restabelece e percebe que Marvin e Zaphod desapareceram. Eles por outro lado estão como que congelados no tempo exatamente antes do ataque mortal… 

Cortamos para a sede do Guia. Um lugar de tanto luxo que chega a ser decadente. Zaphod foi transportado para lá. Não sabe por que, nem como chegou. É quando seu cérebro lobotomizado envia uma ideia, ele reluta um pouco antes de acatá-la. Ele segue é vai em busca de um editor específico do guia, junto com Marvin. O prédio é atacado pelo governo dá galáxia, que está perseguindo Zaphod, afinal, não só ele abandonou a presidência, como roubou a Heart of Gold. Ele se encontra com o Roosta, enquanto Marvin é posto para enfrentar os robôs de ataque. E Marvin ganha. Muito possivelmente diferente do que você imagina. 

Infelizmente, nada disso adianta, já que eles simplesmente resolvem levar o prédio inteiro, e por consequência Zaphod, para seus mestres. E aparentemente, por causa do plano que Zaphod está trabalhando há anos… Roosta informa que ele será colocado no Vortex de Perspectiva Total, o mais selvagem modo de matar uma pessoa. Que basicamente mostra a ela seu tamanho em relação ao universo e o quão minúsculo se é. 
Obviamente Zaphod não é afetado pelo Vortex. 

Ou será que não? Após sobreviver, Zaphod busca uma forma de fugir e encontra uma nave. Nesse ponto que você começa a perceber uma predominância que se estabelece na série: humor negro. 
Sempre houve uma ponta de humor negro na série, mas é nesse livro que as coisas se tornam… Mais frequentes. E mais pesadas. 
Por exemplo, essa nave está parada, aguardando o recebimento de toalhas umedecidas com aroma de limão. Porém, a civilização que aqui habitava, morreu. Ao invés de seguir viagem, os autómatos da nave decidiram manter os passageiros em animação suspensa, os acordando anualmente para chá e bolachas… durante milénios. Ao serem acordados, eles lutam, gritam e desesperadamente tentam fugir, apenas para serem novamente jogados em animação suspensa. 

O computador explica que eventualmente uma nova civilização irá surgir no planeta e entregar as toalhas umedecidas, portanto o melhor a fazer é esperar. A insanidade dessa decisão, assim como sua lógica, não fazem parte do mundo biológico, mas para a nave, é uma decisão óbvia. É esse tipo de cena que começa a ser tornar comum, mostrando um lado de Douglas Adams que me incomoda um pouco. 

É também assim que Zaphod encontra o editor do Guia que ele procurava. Aqui vemos como Zaphod é/era genial. Tudo isto faz parte do plano. Inclusive um detalhe: quando Zaphod tenta fugir dá polícia, ele pula pela janela. Isso ativa um universo paralelo simulado, projetado para fazer com que Zaphod seja o centro do universo e ele sobreviva ao Vortex de Perspectiva Total. Inclusive, a Coração de Ouro está no bolso de sua jaqueta. Irritado, ele entra na nave, seguido do editor, que o instiga a seguir o plano de encontrar o real poder dá galáxia. 

Mas Zaphod não quer nem saber. Ele está com fome e pede para a nave levá-los para o restaurante mais próximo. E é o que ela faz, pulando milhões de anos para o futuro, para o Restaurante no fim do universo. 

Eu gostaria de tirar um momento para ponderar sobre esse restaurante. 
Eu o considero uma das mais niilistas criações literárias jamais criadas. 
Por que? 
Imagine o fim de tudo que existe. O ponto final da existência. Não dá existência como a conhecemos, mas o fim de tudo. O fim absoluto. 
Agora imagine transformá-lo em um espetáculo. Não somente um espectáculo, mas um espetáculo cansado, uma distração, como um show de velhos ex-famosos em Las Vegas. 
Não só isso. 
Coloque preços absurdos nós pratos, porém como estamos no fim do universo, qualquer quantia em uma poupança fará com que você tenha todo o dinheiro imaginável. 
Coloque para coroar um apresentador cínico e desiludido fazendo piadas sobre a situação. 
Dificilmente se encontra algo assim. 
O fim de tudo é um espectáculo de segunda categoria, um paraíso hedonístico onde se vai para esbanjar. Onde todos que foram alguem passam por lá. Uma aberração espaço-temporal de proporções realmente cósmicas. 
Por fim, coloque Zaphod falando que isso tudo é chato, algo que nem vale a pena ver… 

Após comerem, a trupe resolve fugir, não é sem antes esbarrar em caricaturas bizarras, como o vocalista da maior banda de rock de todos os tempos, que está passando por um ano fisicamente morto para evasão fiscal, um profeta ressurgindo segundos antes do Apocalipse e o pobre Marvin que ficou esgotando por eles esse tempo todo nesse planeta… 

Marvin, por falar nele, começa a exibir um comportamento genial, onde não somente continua sendo desagradável e depressivo, como se torna extremamente passivo-agressivo, com direito a cálculos para ser ainda mais desagradável. Um toque genial para um personagem que adoro. 

Eles roubam uma nave, pois Zaphod se recusa a seguir o plano que ele mesmo traçou. Roubam a nave do roqueiro morto, que por acaso está programada para se colidir com um sol… 

Outro ponto que considero exageradamente desesperador é o show da tal banda de rock, o qual inevitavelmente mata seus fãs no choque pirotécnico do sol, ou com o som insanamente alto de seus alto-falantes… imagine ir para um show de rock onde o resultado é morte ou quase lá…. 

Por fim, a trupe tenta fugir da morte iminente por meio de um teleporte aleatório que os lança pelo universo. Marvin, permanece na nave para operar o teleporte e… Encontrar seu fim dentro do sol… 

Zaphod e Trillian são lançados na Coração de Ouro, onde encontram o editor, pois sim, Zaphod havia planeado tudo. E ainda falam como se ele fosse um idiota… eles vão ao encontro com o verdadeiro senhor do universo, o centro do poder. 

E obviamente, não é o que esperávamos. Um cara simples, que duvida de tudo é só acredita no que vê diante de seus olhos. Sinto até uma certa semelhança com Azathoth de Lovecraft, o ser universal, insano e sem inteligência. As decisões são feitas quando os líderes do universo trazem problemas para ele resolver, o qual ele faz com base no que acredita. Afinal, como Douglas coloca, se não devemos entregar o poder para quem o deseja, somente alguém sem a menor vontade ou ambição sobre poderes deve detê-los. Zaphod e Trillian se entendiam e vão embora, deixando o editor com o senhor de tudo, o qual o tranca fora de sua casa. Na chuva. 

Por outro lado, Arthur e Ford são lançados em uma nave…  curiosa. É uma nave de colonização cheia de… Gente inútil. Agentes de pesquisa de opinião insistentes e persistentes, limpadores de telefones, cabeleireiros inovadores que testam cortes sem sua permissão, atendentes de telemarketing mau humorados, seguranças com mania de grandeza… você conhece o tipo. 
O planeta original permanece com os grandes génios e líderes assim como os trabalhadores esforçados, os quais somos informados que levaram vidas incríveis até morrerem de um vírus mortal surgido de bocais de telefone sujos… 
Lembram quando falo sobre certo padrão depreciativo e de humor negro questionável? Pois é… 

Ah sim, e essa gente são nossos antepassados, pois essa nave cai no nosso planeta, aproveitando e destruindo os planos do computador que responderia sobre a vida, o universo e tudo o mais… ah sim, isso sem antes Adams colocar a terra sem intervenção humana como a maior beleza do universo. Como disse, certas coisas começam a me incomodar. Por exemplo, Ford começa a agir como se a Terra pré-humana fosse o melhor lugar do universo… 

E não esqueçam que Arthur e Ford estão ilhados nesse planeta com essa gente. Eles buscam algum lugar onde consigam pegar uma transmissão, esbarram com nativos, e como dito, se apaixonam pela beleza da Terra. No fim, Arthur e Ford se resignam a viver com essas pessoas, ignorando que a espécie nativa do planeta, que buscava a real pergunta para a resposta definitiva, está morrendo devido às influências ambientais. 

Uma coisa que se começa a perceber já nesse livro, é que algumas piadas, ao serem repetidas, vão perdendo a graça. Basicamente o eterno horror e desespero de Arthur começa a me irritar. 
Da mesma forma, é possível notar um certo ar de infelicidade e existencialismo: psicólogos querendo destruir a resposta para a vida, o universo e tudo mais, assim como um certo descaso com a existência como um todo. O Vortex de Perspectiva Total é outro ponto incômodo, nos forçando a ver que de uma perspectiva ampla, não somos nada, totalmente incapazes de fazer ou mudar algo de forma satisfatória. Algo que discordo também, mas por minhas perspectivas filosóficas. 

Apesar disso, ainda considero esse livro excelente, cheio de ideias magnífica, visões de grande beleza e um humor excelente. 
Infelizmente, esse é um dos últimos livros da série que realmente adoro. 
Daqui pra frente, é só ladeira abaixo. 

Inclusive, após chegar no fim da ladeira, teve alguém que se dispôs a cavar um buraco  para baixar ainda mais o nível… 

28 de novembro de 2018

O Guia do Mochileiro das Galáxias - Douglas Adams (O Guia do Mochileiro das Galáxias #1)

Imagine:
Anos 70.
All along the watchtower tocando ao fundo
Muitos a chamam de a era de ouro da ficção científica.
Star Trek nas televisões, Star Wars no cinema. Grandes ícones, mas não os únicos. Doctor Who em sua época mais famosa, Battlestar Galactica, milhares de livros, séries, quadrinhos!

Caso queira saber quem são, clica aqui

A humanidade vislumbrava um futuro incrível, a humanidade no espaço! Ideais maravilhosos aplicados à sociedade, à vida, aos alienígenas! Ainda não havíamos entrado no horror galáctico, Alien ainda tinha bons anos antes de sair do papel. A humanidade se via dominando o espaço, da mesma forma que o imperialismo dominou o mundo!
Uma visão globalista, universalista!
Mas um homem mudou isso.
Douglas Adams.

Sim. Esse senhor.

As primeiras linhas desse livro quebram anos de tradição na ficção científica.
A humanidade não era algo belo, incrível e maravilhoso.
Não.
Em suas palavras, vivemos "nos confins inexplorados da região mais brega da Borda Ocidental desta Galáxia."


Sim.
Nós. 
Os rednecks do universo. 

Imagine que você está acostumado a ver Capitão Kirk seduzindo e salvando alienígenas. Luke Skywalker como um destemido rebelde lutando pela liberdade. 
E então você é apresentado como... um redneck. Um povo brega, mesquinho, infeliz e desesperado atrás de dinheiro. 
Pois é. É assim que se abre esse livro.
O primeiro de uma trilogia de cinco livros. 
Sim. É complicado. 
Somos apresentados a uma garota, uma mulher que irá reescrever o mundo, talvez o universo!
Mas ela não é nossa heroína.
Não.
Mas mantenha ela na memória...

A história é sobre um bando de aliens e um inglês mediano e medíocre...
Em seguida, somos colocados no nossos lugar, com uma explicação do livro mais vendido e conhecido do universo: O Guia Do Mochileiro das Galáxias.
Sim, veja o vídeo. 
É uma das poucas maneiras aceitáveis de se apresentar a capa desse livro.




Não só isso, uma enxurrada de outras informações, para nós desconhecidas, é apresentada. Mostrando o quanto não sabemos. O quanto estamos.... Bem...
Fora de moda.

Você é capaz de imaginar o quão bizarro, estranho e, até mesmo, alienígena esse conceito é para a época?
E quantas pessoas gostaram disso?
Pois é.
Você começa a entender o porquê essa série é tão famosa e amada ao redor do mundo...

Ah sim, e não esqueçamos o número enorme de frases e citações que se pode tirar de qualquer um dos cinco livros da trilogia.
(Não, não são seis. Jamais vou aceitar aquilo como parte disso... mas chegaremos lá. Aproveitando, ignore que essa trilogia tem cinco livros.)

Bem, a realidade é que nem sei por onde começar.
Falar do plot do livro? Dos personagens maravilhosos? Das explicações dadas pelo Guia?
Sobre Não Entre em Pânico?
A tarefa é bem complicada.


Uma boa ideia é falar como Arthur Dent, o nosso relutante (bem relutante) protagonista.
Arthur contradiz a jornada do herói.
Pra quem não conhece, uma breve explicação.
Atenção: cuidado para spoilers de praticamente tudo que você já assistiu, leu ou mesmo coisas que você pretende ler ou assistir.

Aham.
A jornada do herói: partida > iniciação > retorno.
Como assim? Bem, segundo os ideais de Campbell, (e não estamos falando de sopa aqui), a jornada se divide em etapas.
Mundo comum, onde é apresentado o herói no seu mundo comum. Chamado para aventura, onde algo acontece que faz o herói ir para a aventura. A recusa ao chamado, onde algo o impede de ir. Encontro com o mentor, onde um mentor o encaminha a viagem, ou um objeto, ou um amigo. Passagem pelo 1° portal, onde ele finalmente sai de seu mundo comum. Provações e Aliados, onde o herói passa por aventuras, iniciações, conquista aliados. Aproximação é a vitória sobre as provações iniciais. Crise, onde ocorre um ponto crítico que pode acabar com a jornada. Recompensa, onde se colhe os benefícios da crise. Ressurreição, onde o herói se apodera dos benefícios, ganhando poderes. Regresso, onde o herói retorna a seu ponto de origem, com suas experiências, ou estabelece um novo mundo comum.
Você deve ter reconhecido uma série de livros, histórias e filmes.
E não está enganado.

Arthur é arrancado de seu mundo comum, a contragosto, e não tem um mentor. Ford mais se preocupa com sua toalha do que com a integridade emocional de Dent. Sua passagem pelo portal o arremessa de novo e de novo, sem parar, no mais puro caos. Ele não enfrenta suas provações, geralmente elas se resolvem sem ele. Ele não ganha exatamente aliados, seus companheiros de viagem não são o que se chamaria de aliados. Sua crise, não é resolvida, mas sim cresce a cada momento, a cada aventura, sem nenhuma resolução. Não há recompensa alguma para Dent. Até existe uma ressurreição, mas ele não ganha absolutamente nada. E seu regresso, bem, não é exatamente agradável… apesar dele estabelecer um novo mundo comum.

Ok. Chega de estragar sua vida mostrando como o grosso das histórias segue esse mesmo padrão. (Pst, pst: Star Wars, Harry Potter, Um tira da pesada... sim, a lista é enorme.)
Vamos falar dos personagens.


Pois Martin Freeman é meu Watson.

Arthur Dent.
Inglês. Gosta de chá. Só queria ter sua vida calma e pacata de volta. Como já dito, arrastado pelo universo gritando e reclamando, totalmente a contragosto.
Um pouco apático, em constante estado de choque, pânico e horror cósmico.
E odeia quintas feiras…
Sim, há muito pouco a se falar dele.
Eu... tolero sua existência no geral...


Ambos pois adoro ambas as versões...
Mos Def tem a energia, Dixon tem o look

Ford Prefect.
Betlegeusiano. Um dos escritores do Guia. Busca diversão, entretenimento e prazeres. Não o julgue, sua espécie não tem conceitos de profundidade espiritual, moral ou… Bem, qualquer que seja. Eles são o que são.
Por bem ou mal.
Curiosamente, Ford é extremamente convincente, um ótimo argumentador. Ou melhor dizendo ele é um conman. Um trapaceiro. Falastrão.
Sempre ciente de onde sua toalha está.
Meu segundo favorito na série.
Ah, e sem o menor senso comum.


Porque eu prefiro a versão de Sam Rockwell

Zaphod Beeblebrox.
Presidente das Galáxias. Duas cabeças, três braços, nenhum cérebro. Primo de Ford. Egomaníaco. Insano. Curiosamente genial. Perpetuamente em estado alterado. Eleito sete vezes A mais mal-vestida criatura senciente no Universo conhecido, criador da Dinamite Pangalática (um drink cuja descrição é ter seu cérebro atingido por uma fatia de limão envolvida em uma enorme barra de ouro. Sonho de consumo.)
No filme, (o qual sou obrigado a admitir que gosto) ele é apresentado como um idiota.
Mas nos livros e no rádio... como dito, curiosamente genial e capaz de planos mirabolantes.
E imaturo, temperamental e extremamente impulsivo.
E demonicamente carismático.
Meu terceiro personagem favorito.

MARVIN!!

Marvin.
O androide paranoico e maniaco depressivo, apesar de não ser nenhuma dessas coisas.
Um dos seres mais inteligentes do universo.
O primeiro robô com personalidade.
E ele é simplesmente cansado da vida, o universo e tudo o mais.
E sim, é dai que vem o nome do álbum do Radiohead.
Sim. E ele é responsável por todas as tarefas braçais da série.
Meu personagem favorito.

Tricia Marie McMillan

Trillian.
Uma matematica e astrofisicista que Arthur tentou dar em cima em uma festa e que foi embora com Zaphod.
Como eu disse: carisma avassalador.
Trillian não é tão parte do grupo assim.
Não apenas por ela ser uma mulher no meio de uma festa de salsichas, mas pelo fato de que ela é inteligente. Realmente inteligente. E ambiciosa.
Ao longo dos livros ela se distancia do grupo, salva o universo e vira uma famosa repórter.
Convenhamos, você também não iria ficar ao lado dos outros aqui descritos, se tem o universo a sua disposição...
Não gosto dela no filme. Prefiro no livro, onde ela meio que se afasta deles por... ter coisa melhor pra fazer.
Ah, e o triangulo amoroso é exclusivo do filme.

Prefiro essa versão.
Por fim, Heart of Gold.
A nave que inicia tudo. 
Portando um motor de improbabilidade infinita, ela é a nave inicial que carrega essa gente toda pelo universo.

Por fim, existe um personagem importante sobre o qual não irei falar, não quero estragar a surpresa. Deixo apenas essa imagem.
Quem entendeu...

Penso seriamente em tatuar algo em homenagem a essa cena.

Não quero estragar a experiência de quem ainda não leu a série. 
Então se você não leu a série, recomendo parar por aqui e ler. Acredite, não é difícil sentar e ler a série toda em um único dia. Apenas pegue um… longo dia. 

Não vou me ater demais aos detalhes, afinal os livros podem ser resumidos rapidamente, se você ignorar todo o humor e piadas espalhadas.

A casa de Arthur está no caminho de uma rodovia, fato ao qual ele protesta contra. Ford o tira de la e o leva para um pub, onde o informa que a Terra, vai ser destruída. Ele é interrompido pelos vogons, que vieram concluir o serviço, afinal, a informação estava disponível em Alpha Centauro, e se eles não se interessam por assuntos de sua vizinhança, muito menos eles. A Terra é destruída, Arthur pega uma carona com Ford. Na nave dos vogons. Após serem torturados com poesia vogoniana, são arremessados no espaço e salvos por Zaphod e Trillian. Zaphod tem um plano! Mas ele não se recorda qual, apenas que tem que segui-lo. Seu cérebro teve uma parte cauterizada, que é de onde vêm as ideias para seguir com o plano. E foi ele mesmo que fez isso...

Eles chegam ao planeta Magrathea, um planeta lendário por construir outros planeta por encomenda. Todos, com exceção de Arthur e Marvin, entram para investigar, porém são nocauteados por um gás. Arthur, por outro lado, se encontra com Slartibartfast, um dos construtores de planetas. Ele explica a situação para Arthur. 

Ratos pagaram Magrathea para construírem a Terra, de acordo com os planos de outro computador, para descobrir qual a pergunta para a resposta sobre a vida, o universo e tudo o mais. A resposta é 42… mas ninguém sabe qual a pergunta. Ao invés de deixar a Terra calcular novamente a pergunta, os ratos pretendem extrair do cérebro de Arthur algo próximo a isso. O grupo foge, enfrenta a polícia sideral, mortos por Marvin devido à uma conversa com o computador da nave que regulava seus sistemas de sobrevivência. Os raros inventam algumas perguntas possíveis e, felizes de encontrar algo aceitável, ignoram Arthur e a humanidade como um todo. 

Por fim, o livro acaba com Zaphod informando Arthur que eles vão comer algo no restaurante no fim do universo. 

Sim. Acaba assim. 
Como eu disse, não há resolução, os problemas se resolvem sozinhos e não há nada que Arthur tenha ganho em sua jornada. 
Não é um final ruim. 
Ele define algo extremamente curioso: em um universo tão grande, tão extenso, o que realmente faz sentido? O que realmente importa? A resposta já é de conhecimento, apesar de não saberem a resposta, muito provavelmente não entendemos a pergunta também. 

O que importa é a jornada. 
E isso é o que faz esse livro ser tão bom. A jornada de Arthur Dent é extremamente interessante. Os vislumbres que o Guia nos dá, ainda mais. A pluralidade do universo fascina, sem deixar de nos surpreender. 
Tudo isso é de uma beleza inenarrável, um universo rico e fabuloso. 
E nos deixa esperando por mais. 
E ele nos dá mais na sequência. 

Então, até lá. 

See ya